domingo, 17 de outubro de 2010

Chegadas e Partidas sem Despedidas






















Sempre estudei violino. Tocava muitíssimo bem. Também pudera, tantos anos passados dentro de um conservatório. Oras, eu teria que ter aprendido.Até conhecê-la, achava que existia apenas o violino e suas notas.Ainda lembro do dia em que me apaixonei por suas lindas e brancas pernas tortas. Estávamos em uma livraria. Ela lendo Chopra e eu... Bem, tentando ler Murakami.Tentando parecer inteligente, perguntei a ela se conhecia Murakami.- Sim, ele faz belíssimas bolsas, respondeu.Eu sem entender nada, apenas a olhei fixamente.- Você disse, Murakami, designer da Louis Vuitton, respondeu bastante confusa.Dei uma risada nervosa, tão linda e tão fútil, pensei. Se não estivesse tão enfeitiçado por aquela garota, certamente a teria deixado falando sozinha. Porém, expliquei que se tratava de um escritor japonês e tal. E principalmente, que certamente não estávamos falando da mesma pessoa.- Japonês é tudo igual mesmo, rostos, nomes, ela disse.Quanta futilidade! Nos encaramos um pouco. Convidei-a para tomar algo. Pedimos cerveja. Ela tomou no gargalo, sem o menor embaraço. Conversamos sobre livros (dessa vez sem homônimos), cinema, relacionamentos e assuntos diversos. Convidei-a para ir até o meu apartamento. Ela aceitou e nunca mais foi embora.- Toca pra mim, ela sempre dizia.Eu passava praticamente o dia todo tocando o meu violino, enquanto ela desenhava roupas e sapatos.A sensação de ver aqueles longos fios, escuros, lisos e soltos, acompanhando a sua respiração era indescritível.Também sabia que era desejado. Ela encarava o meu violino o tempo todo. Muitas vezes desistia do lápis apenas para me ver tocar.Nos últimos tempos, a excitação inicial e o amor à primeira vista foram desaparecendo. Já não me importava se ela estava presente. Era claro também que ela já não ouvia as minhas músicas com o mesmo apreço. Nem pedia mais. Não sei bem o que, e nem quando aconteceu.Já faz um mês que ela partiu. Desde então, não fixo o meu olhar em nada. Me disseram que ela anda arredia e distante também. Ninguém entende o que nos aconteceu.Mas hoje ao quebrar o meu violino, me libertei. Espero que ao cortar o seu cabelo, ela tenha se libertado também.

Debora Daher

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